Vós, sem dúvida, Veneráveis Irmãos, já percebestes de que perigo ameaçador falamos: é do comunismo, denominado bolchevista e ateu, que se propõe como fim peculiar revolucionar radicalmente a ordem social e subverter os próprios fundamentos da civilização cristã.
... levantamos a voz em solenes protestos contra as perseguições desencadeadas contra o nome cristão, tanto na Rússia, como no México, como finalmente na Espanha.
... esta doutrina [comunista] rejeita e repudia todo o caráter sagrado da vida humana ...
(Papa Pio XI, Carta Encíclica Divinis Redemptoris sobre o comunismo ateu)
O Papa Pio XI, ao iniciar a
Carta Encíclica Divinis Redemptoris sobre o comunismo ateu, faz remissão à promessa dum Redentor Divino que veio à Terra,
quando chegou a plenitude dos tempos (
Gl 4,4), e inaugurou para todos os povos uma nova civilização: a civilização cristã (n. 1). Alude também à "miserável queda de Adão", a partir da qual:
começou a travar-se o duro combate da virtude contra os estímulos dos vícios; e jamais cessou aquele antigo e astuto tentador de enganar a sociedade com promessas falazes. É por isso que, pelos séculos afora, as perturbações se têm sucedido umas às outras até à revolução dos nossos dias, a qual ou já surge furiosa ou pavorosamente ameaça atear-se em todo o universo e parece ultrapassar em violência e amplitude todas as perseguições que a Igreja tem padecido; a tal ponto que povos inteiros correm perigo de recair em barbárie, muito mais horrorosa do que aquela em que jazia a maior parte do mundo antes da vinda do Divino Redentor. (n. 2)
Depois de várias denúncias sobre o comunismo, Pio XI viu-se no dever pastoral de levantar a voz, uma vez que, com ímpeto de habilidosos instigadores, o perigo comunista agravava-se a cada dia. E o fez solenizando mediante a promulgação da antes mencionada Carta Encíclica Divinis Redemptoris sobre o comunismo ateu, datada de 19 de março de 1937, na festa de São José, Padroeiro da Igreja Universal, como se lê desta passagem:
É por isso que julgamos dever Nosso levantar de novo a voz; e fá-lo-emos por meio deste documento de maior solenidade, como é costume desta Sé Apostólica, mestra da verdade; e com tanto maior satisfação o faremos, quando é certo que assim correspondemos aos desejos de todo o universo católico. Confiamos até que o eco da nossa voz será acolhido de bom grado por todos aqueles que, de espírito liberto de preconceitos, desejem sinceramente o bem da humanidade. Vem, de certo modo, aumentar nossa confiança o fato de vermos estas Nossas admoestações confirmadas pelos péssimos frutos, que Nós prevíramos e anunciáramos haviam de brotar das idéias subversivas, e que de fato se vão pavorosamente multiplicando nas regiões já dominadas pelo comunismo, ou ameaçam invadir rapidamente os outros países do mundo. (n. 6)
O nome
cristão, o simples nome, nos anos primaveris do cristianismo, não foi um título lisonjeiro. No momento, interessa-nos que, ao tempo da promulgação da sobredita Encíclica, e não diferente nos tempos atuais, o simples nome
cristão motivava, como motiva hoje, o desencadeamento de perseguição aos fiéis cristãos, como bem ilustra o documento pontifício com os casos de Rússia, México e Espanha. O elenco de países onde os cristãos são perseguidos ou discriminados aumentou, e bastante, como se pode ler, em resumo, em
Vatican News; ou, mais completamente, no
Relatório sobre a Liberdade Religiosa no Mundo (14ª edição) da
Fundação Pontifícia ACN.
A
Divinis Redemptoris mantém sua atualidade e está a recordar que o
liberalismo econômico preparou o advento do comunismo. Isto porque, segundo a Encíclica, os operários sofreram duplo abandono: o da religião e o da moral cristã. E artifícios outros propiciaram o aparecimento do chamado
laicismo.
A
doutrina comunista apoia-se no materialismo chamado dialético e histórico, cujo mentor é Karl Marx (1818-1883). Materialismo porque só conhece a matéria, nada além da matéria. Dialético porque há discussão, ou melhor, porque mantém-se de opiniões divergentes. Para essa doutrina, é o método de descortinar conflitos, contrariedades no mundo socioeconômico. Dialético porquanto é seu método de análise socioeconômico. Histórico porque repousa na ação humana no tempo medido por dias, meses, anos..., em que o presente faz-se passado, e o futuro vira presente. Da conjugação desses elementos, infere-se que não é algo estático, mas um movimento, na História, que tem passado, presente e futuro, incitador de embates de tendências contrárias ou provocador de ânimos a contrariedade.
Deus, consequentemente, não faz parte da doutrina comunista. Deus é estranho para ela.
Tudo o que existe move-se da e para a matéria.
Em outras e melhores palavras, diz Pio XI:
Essa doutrina proclama que não há mais que uma só realidade universal, a matéria, formada por forças cegas e ocultas, que, através da sua evolução natural, se vai transformando em planta, em animal, em homem. (Divinis Redemptoris, n. 9)
Nessa perspectiva, não soa censurável que a doutrina comunista não reconheça
caráter sagrado da vida humana, posto que ela é oposta ao sobrenatural. Daí a insensibilidade e o desprezo pela vida humana, coisificada. A vida humana se situa no mesmo plano das coisas.
Dessa coisificação da vida humana, não é estranho que a doutrina comunista subtraia ao indivíduo a liberdade e outros mais atributos, mas, em contrapartida, ela (doutrina comunista) os confere à coletividade. E, na família, a coisa fica mais perceptível.
A começar que a noção cristã de matrimônio é, para a doutrina comunista, algo engendrado, de natureza apenas civil, artificial; a família, também. Daí, e para não entrar em pormenores, fica fácil entender como andam hoje os costumes. Parece que tudo é uma questão de lei positiva, de coisa legislada.
Ao proclamar à mulher uma emancipação dita completa, retira dos pais o
direito-dever de educar os filhos. Nesse aspecto, o Papa Pio XI é incisivo:
Em particular, para o comunismo não existe laço algum da mulher com a família e com o lar. De fato, proclamando o princípio da emancipação completa da mulher, de tal modo a retira da vida doméstica e do cuidado dos filhos que a atira para a agitação da vida pública e da produção coletiva, na mesma medida que o homem. Mais ainda: os cuidados do lar e dos filhos devolve-os à coletividade. Rouba-se enfim aos pais o direito que lhes compete de educar os filhos, o qual se considera como direito exclusivo da comunidade, e por conseguinte só em nome e por delegação dela se pode exercer. (Divinis Redemptoris, n. 11)
Ditas estas considerações sobre a educação, melhor fica para compreender o porquê de os comunistas se agarrarem ferozmente ao sistema cultural e educacional.
Para não alongar, e por ora, ative-me, ligeiramente, sobre os primeiros parágrafos da
Carta Encíclica Divinis Redemptoris sobre o comunismo ateu (Introdução, Capítulo I e parte do Capítulo II), não além do número 11.
Falta, por conseguinte, a incursão em pontos outros, como a
Luminosa Doutrina da Igreja, Oposta ao Comunismo (Capítulo III).
Neste entretanto, podemos adiantar:
Os adeptos da doutrina comunista necessitam, para alcançar seus objetivos, da propaganda e do poder.
E, para mais, evoco a clássica expressão de Pio XI:
Socialismo religioso, socialismo católico são termos contraditórios: ninguém pode ser ao mesmo tempo bom católico e verdadeiro socialista. (Carta Encíclica Quadragesimo Anno, datada de 15 de maio de 1931)
E, ainda mais, ressoam vigorosamente as palavras de São João Paulo II:
O mundo de hoje está sempre mais consciente de que a solução dos graves problemas nacionais e internacionais não é apenas uma questão de produção económica ou de uma organização jurídica ou social, mas requer valores ético-religiosos específicos, bem como mudanças de mentalidade, de comportamentos e de estruturas. (Carta Encíclica Centesimus Annus no Centenário da Rerum Novarum, na memória de S. José Operário, datada de 01 de maio de 1991, n. 60).
Por fim, encerro com as judiciosas palavras do Papa Pio XI:
Outro auxiliar poderoso, que contribui para a avançada do comunismo, é sem dúvida a conspiração do silêncio na maior parte da imprensa mundial, que não se conforma com os princípios católicos. (Divinis Redemptoris, n. 18)
Fonte da imagem:
http://radiovoznoticias.blogspot.com/2014/02/pio-xi-condenou-os-totalitarismos-e.html