sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Cartaz divulgado em rede social desvirtua a noção de família

O homem hoje já não é capaz de formas de discernimento que ultrapassem o fôlego curto do útil e do imediato: já não reconhece o que corresponde ou o que repele as peculiaridades que o tornam verdadeiro homem. 
(Gerhard Ludwig Müller, Pobre para os pobres: A missão da Igreja, Paulus Editora, Lisboa, pp. 93-94)


O Papa Francisco, na recente Viagem Apostólica aos Estados Unidos da América do Norte, afirmou solenemente que a família tem uma carta de cidadania divina.

Porém, não é, assim, como pensa um órgão público do Brasil. Com efeito, o Conselho Nacional do Ministério Público divulgou em rede social (Facebook) cartaz com imagens de bonequinhos, expandindo indevidamente a noção de família, para defini-la como pessoas que se amam e querem ficar juntas ou, como se desponta do cartaz, pessoas e animais que se amam. Ou ainda, como dito na rede social: 

Família = pessoas que se amam e querem ficar juntas

O cartaz acima instila mais. Pelas imagens do cartaz, uma mulher e um felino (gata/o) é uma família! 

É uma situação simplesmente grotesca!

Diante do que o cartaz injeta no imaginário da opinião pública, move a dizer que uma pessoa montada num cavalo possa constituir uma família (pessoa e cavalo). Para a instituição divulgadora do cartaz, isso não é inimaginável!

Na contramão do que incita o cartaz, Jacques Leclercq, com claridade e segurança, aponta o caminho da essência da instituição familiar em A Família (Editora Quadrante e Editora da Universidade de São Paulo, SP):

A sexualidade tem sido estudada no nosso tempo mais do que em nenhum outro, e nesses estudos sublinhou-se a repercussão do sexo sobre o conjunto da personalidade, não somente física, mas intelectual e moral, como também se fez notar até que ponto o homem e a mulher são complementares um do outro, de todos os pontos de vista. A conclusão que daí se desprende é que a união dos sexos não é somente física nem se limita às satisfações propriamente físicas da união, mas tem um caráter moral que exige a união da vida comum, a entreajuda mútua em todas as atividades. O amor dá ao homem e à mulher o desejo dessa união. 
[...]
O amor humano tem, pois, por objeto a união tão completa quanto possível de um homem e de uma mulher que encontram um no outro o seu complemento.
[...]
O homem e a mulher têm necessidade um do outro em toda a progressão de suas vidas, e a vida é um todo contínuo. O desenvolvimento da personalidade masculina reclama a união com uma personalidade feminina correspondente, e o mesmo se passa, em sentido contrário, com a personalidade feminina. (pp. 14-15)

A religião tem muito a ver com a família. Pontes de Miranda reconhece, em sua clássica obra Introdução à Sociologia Geral (Editora Forense, Rio, 2ª edição), que:

Todas as religiões desenvolvem, em sistema de valores, o seu plano de adaptação acima da moral, da economia, do direito, da política. (p. 160)

Ainda esse grande jurista brasileiro:

É por isto que, em certo sentido, a religião julga a moral e esta o direito. (p. 17)

Rodolfo Sacco escreveu, entre outras obras, um livro sobre a antropologia voltada para a área jurídica intitulado Antropologia jurídica: contribuição para uma macro-história do direito (Editora WMF Martins Fontes, São Paulo, p. 315), onde constata que:

Do matrimônio e da filiação, nasce a família nuclear, instituição universal, que satisfaz determinadas necessidades sexuais, econômicas, reprodutivas, educativas.

Genuínos direitos fundamentais são aqueles reconhecidos pelo Estado, isto é, são aqueles que o Estado fundamentalmente os declara, não os cria. Tais direitos antecedem ao Estado. A família é um deles. Ela precede ao Estado.

A família tem seu germe na relação entre um homem e uma mulher. Disso se segue que, para o Direito Civil, ela é declarada pelo instituto do casamento (Art. 1514. O casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz os declara casados); e, para o Direito Canônico, a família é firmada pelo sacramento do matrimônio (pacto matrimonial, pelo qual o homem e a mulher constituem entre si o consórcio de toda vida..., cfr. cânone 1055, § 1).

Nas normas de ambos os Códigos (Direito Civil e Direito Canônico) não se registram, e de outra forma não poderia ser, pessoas outras que não sejam o homem e a mulher a gestar uma família. Figuras outras, eventuais, que escapem a esse figurino estruturante da sociedade, e também divino, podem ter outros nomes (para coisa nova, nome novo), mas nunca o nome de família. A semente da família está no encontro entre um homem e uma mulher. E não entre dois homens ou duas mulheres, e muito menos entre uma pessoa e um ou mais animais (ainda que domésticos).

O Conselho Nacional do Ministério Público está vulgarizando, banalizando o conceito de família perante a opinião pública. É isso é muito ruim!

A família tem sua base nuclear no amor que leva à união de um homem e de uma mulher

Ademais, o povo brasileiro, na sua quase totalidade, tem na sua gênese a formação religiosa judaico-cristã.

O amor é o eixo do cristianismo. Nesse sentido, Romano Guardini afirma-o em O mundo e a pessoa: ensaio para uma doutrina cristã do homem (Livraria Duas Cidades, São Paulo, p. 207):

Diz-se - e o Novo Testamento parece confirmá-lo - , que o cristianismo é a religião do amor.

O reducionismo do amor a interesse ou a gosto pessoal contradiz com a matriz de formação do povo brasileiro.

Concluo com as palavras do grande estadista britânico Winston Churchill:

Onde a família começa? Ela começa com um jovem se apaixonando por uma garota - nenhuma alternativa superior foi encontrada ainda.


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Fonte da imagem:
https://www.facebook.com/cnmpoficial/photos/a.320163384712345.73373.188813301180688/973550232706987/?type=3&theater

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